quinta-feira, 4 de novembro de 2010

DCE da Unesp divulga nota em repúdio ao "rodeio das gordas"

A agressão ocorreu no InterUnesp 2010, jogos universitários realizados em Araraquara, de 09 a 12 de outubro

Um grupo de 50 alunos da Universidade Estadual Paulista (Unesp), uma das mais importantes do país, organizou uma “competição”, batizada de “Rodeio das Gordas”, cujo objetivo era agarrar suas colegas, de preferências as obesas, e tentar simular um rodeio – ficando o maior tempo possível sobre a "presa".

A agressão ocorreu no InterUnesp 2010, jogos universitários realizados em Araraquara, de 09 a 12 de outubro. Anunciado como o maior do país, o evento esportivo e cultural, que reuniu 15 mil universitários de 23 campi da Unesp, virou palco de agressão para alunas consideradas acima do peso.


Leia a nota em repúdio ao "rodeio das gordas" escrita pelo DCE da Unesp

É com profunda indignação que nós do Diretório Central dos Estudantes manifestamos nosso repúdio aos estudantes idealizadores e executores da violência contras as mulheres intitulada "rodeio das gordas".

O feito animalesco destes execráveis estudantes expressa dentro da Universidade os valores mais conservadores da sociedade: o racismo, a opressão às mulheres, a homofobia etc. A estigmatização do corpo das mulheres por um padrão de beleza é uma das facetas mais nefastas desta sociedade. A naturalização - por parte da sociedade, através da mídia, de seus intelectuais e das próprias instituições que dissimulam a violência e opressão, - de um padrão estético e de uma imagem abusiva e de consumo das mulheres enquanto objetos de desfrute dos homens criam uma criminosa legitimidade para barbaridades como esta ou como a agressão a um casal de homossexuais numa festa organizada pela Atlética (mais uma vez as Atléticas!) da ECA-USP (realizada no último dia 23 de outubro). Elemento fundamental, ignorado, desse padrão estético é a perpetuação quase inconsciente do racismo já que a medida da beleza, do correto, da normalidade é a pele branca, os cabelos lisos e o corpo esbelto e jovem.

O meio universitário deveria irradiar os valores mais avançados da sociedade. Isso se fez real em vários momentos históricos, com as/os estudantes cumprindo um papel questionador e transformador, se lançando contra arcaicos preconceitos como fez a juventude nos anos 60. Este legado é o que deveria seguir primando, pois sem ele a universidade perde grande parte de seu sentido: a de pensar criticamente, buscando as potencialidades ainda não realizadas de si mesma, e da sociedade de conjunto. Mas não o faz. Casos como este mostram que por trás do discurso da “excelência” das universidades estaduais paulistas, está não somente um projeto excludente com o filtro do vestibular, mas essencialmente conservador em seu conteúdo ideológico, como podemos ver na ausência da discussão sobre racismo, machismo e homofobia nos currículos e a falta de incentivo às pesquisas e extensão que trabalham com esses temas.

O Interunesp foi criado pela reitoria com o nome "Jogos Unesp", em meados dos anos 70, em meio à ditadura militar, quando as/os estudantes cumpriam importante papel se organizando para combatê-la. Atualmente, este evento é organizado por “estudantes” associados nas Atléticas, recebe patrocínio de empresas como a Skol, Freegels e a Kraft Foods, movimenta milhões de reais e é o meio pelo qual alguns “estudantes” enriquecem fazendo carreira como promotores de eventos, além de desfrutar do respaldo da reitoria que, por exemplo, até no calendário oficial da UNESP, prevê e divulga anualmente o InterUnesp. Também é importante destacar que esta burocracia acadêmica, que sempre nega qualquer auxílio de transporte para as atividades do movimento estudantil, financiou com a maior tranqüilidade vários ônibus para o Interunesp neste ano, mesmo tendo conhecimento que este espaço legitima a opressão.

Um pouco de experiência com as diretorias e reitoria da UNESP ajuda a perceber o distanciamento entre seus propósitos e os interesses da humanidade. Os casos de violência contra a mulher são abafados pela reitoria e direções locais em cada oportunidade que assim conseguem fazer. São vários os casos de assédios, e até de estupro, dentro dos campi, que os administradores da Universidade omitem da própria comunidade acadêmica (funcionários, estudantes e professores). Além disso, a saída que apontam as “comissões de investigação” da burocracia acadêmica, escolhidas a dedo por diretores e reitoria, já chegaram ao ponto de punir as vítimas e deixar livre o agressor - como foi o caso ocorrido na UNESP de Rio Claro, em 2008, quando uma comissão criada pela diretoria do campus não puniu um aluno estuprador, mas sim sua vítima acusando-a de ter incentivado à ação. A postura que tomam estes administradores não pode ser compreendida sem destacarmos o poder que concentram a partir de uma arcaica e antidemocrática estrutura de poder onde são eleitos por uma pequena casta de professores (além dos reitores, que são escolhidos diretamente pelo governo do estado, como foi o caso de João Grandino Rodas, USP), ficando praticamente ausente a opinião de funcionários e estudantes.

Em declaração pública sobre o caso, no site da Unesp, a reitoria deixa um posicionamento vago quanto à punição aos estudantes que cometeram a violência, tentando se isentar em base nos procedimentos burocráticos aos quais o caso deve ser submetido. O que não vem a público é que a punição aos movimentos em defesa da universidade pública e democrática é imediata e voraz. Por exemplo, neste momento 14 estudantes da moradia da USP estão ameaçados de expulsão, sindicalistas do SINTUSP são demitidos e processados e estudantes da UNESP de Bauru também estão sendo perseguidos. Ou seja, dois pesos, duas medidas. De um lado a conivência e do outro a repressão aberta contra aqueles que resistem aos ataques à universidade pública e contra as políticas de maior elitização.

Também não faltam medidas para tentar impedir a realização de verdadeiras festas dos estudantes isentas das brutalidades que aconteceram no Interunesp, como se expressa atualmente na ofensiva contra o "IFCHSTOCK", na Unicamp, com ações judiciais, sindicâncias e invasão da PM no campus para apreender toda a infra-estrutura da festa. É importante ressaltar que o "IFCHSTOCK" ocorre há anos naquela Universidade, sendo um importante espaço de manifestação cultural e apropriação do espaço público para fins públicos. Diante disso, as/os estudantes do Instituto de Economia da UNICAMP, onde está ocorrendo a repressão, decidiram fazer uma heróica greve, que se enfrenta com esse cerceamento das liberdades estudantis sobre a universidade e também contra a repressão que a reitoria quer impor aos estudantes.

O que entrelaça esta fina rede de interesses é o projeto de privatização para a educação, baseado na exclusão da maior parcela da juventude, principalmente da juventude trabalhadora e pobre, mas também na aplicação de um ensino restritivo, meramente voltado à qualificação de mão-de-obra, em detrimento do caráter reflexivo do conhecimento que se espera dessas instituições e que é materializado por esses mesmos senhores que não punem atrocidades como esta, pois são coniventes com a visão de mundo e projeto de sociedade ali representados.

A reflexão sobre este caso específico, ou seja, sobre a opressão e violência às mulheres nas universidades deve se dar à luz do contexto das eleições nacionais, onde vimos os candidatos a presidência desse país disputarem o posto de quem é o maior inimigo dos direitos democráticos das mulheres e dos homossexuais, numa enorme campanha contra o direito ao aborto e ao casamento igualitário, contribuindo para uma cultura e ambiente hostis aos direitos democráticos das mulheres, dos negros e homossexuais, enfraquecendo os que lutam por eles e fortalecendo os que reproduzem essa moral opressora, favorecendo práticas como o “rodeio de gordas”.

Defendemos uma sociedade livre, onde as pessoas possam ser gordas ou magras, hetero ou homossexuais etc., sem serem punidas, agredidas e humilhadas por isso. Defendemos o fim de toda e qualquer forma de opressão às mulheres e também uma universidade realmente pública, que seja um centro difusor de conhecimento e uma ideologia não opressora, e que toda a população tenha acesso. Não somente condenamos, mas combatemos práticas como o "rodeio de gordas", que na verdade estão presentes nas universidades desde os trotes aplicados por veteranos contra ingressantes, quando também não são poucos os casos de agressão, humilhação, assédio, machismo etc. Louvamos a iniciativa das estudantes de Assis que denunciaram o caso e que impulsionaram o primeiro ato em resposta a essa atrocidade, realizado semana passada, no campus de Assis e nos somamos aos gritos dessas/es colegas, assim como de todas/os em geral que estão indignados com esse fato, de “Abaixo a ditadura da beleza!”

Como resposta a essas agressões e perseguições não podemos ter nenhum sopro de confiança nas diretorias e reitoria. Para a superação definitiva dessas práticas e a punição aos agressores, é necessária uma ampla campanha, com todos os instrumentos de divulgação, como cartazes, notas públicas, vídeos, manifestação de intelectuais, abaixo-assinados, atos, debates, que desde já nós do DCE nos propomos a organizar, impulsionando uma ampla campanha, além da criação de uma comissão de investigação que seja independente da reitoria e direções locais e que se enfrente diretamente com as intenções apaziguadoras dos administradores e, quem os escolheu, o governo do estado. Colocamos-nos a construí-la efetivamente, somando forças com todos os setores progressivos da sociedade

É nesse sentido que chamamos todas/os as/os estudantes, funcionários, professores, bem como todas as organizações políticas, grupos feministas, de direitos humanos, sindicatos e movimentos sociais em geral, para que juntos possamos construir um amplo ato no próximo dia 17, em frente a reitoria da UNESP no Anhangabaú em São Paulo , declaradamente contra a opressão e a violência às mulheres, mas também em defesa da permanência estudantil em nossas faculdades que já vem sendo motivo de mobilização e que levou a realização de um importante ato no último dia 15 de outubro com mais de 100 estudantes. Também queremos levantar a demanda de expansão de vagas com verbas para que seja com qualidade, assim como nos manifestarmos contra a reforma universitária tucana que vem sendo implementada nas estaduais paulistas, com João Grandino Rodas assumindo a dianteira destes ataques. Apoiamos e nos somamos a todas as iniciativas e atos locais organizados em repúdio a essa violência como o ato que ocorrerá amanhã (04/11) no campus da UNESP de ASSIS.

Também vamos organizar um grande Festival INTERUNESP Contra a Opressão nos dias 26 e 27 de novembro que possa ser um espaço de confraternização em contraponto às festas que legitimam as opressões. Chamamos a todos as/os estudantes a se integrar de todas essas ações contra a opressão a começar realizando assembléias de base até o dia 11/10 para organizar atos, atividades e debates locais e a participação nestas atividades gerais.

Para darmos um basta à opressão e violência às mulheres, todos ao ato na reitoria da UNESP no próximo dia 17!


Organizar um grande Festival INTERUNESP contra as opressões! Pela punição aos agressores que praticaram o “rodeio de gordas” no INTERUNESP!

Nenhuma confiança nas diretorias e reitoria que abafam os casos de violência às mulheres e não punem os agressores, Comissão Independente de Investigação para apurar o caso! Por uma ampla campanha em todas as Universidades contra o machismo e a opressão!

Diretório Central dos Estudantes da UNESP/Fatec – Helenira Rezende

dceunespfatec.blogspot.com


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